A Palma
Na verdade, a palma transcende o conceito de patrimônio material ou imaterial, e o coloca em revisão diantes das manifestações das tradições de um povo.
Na etimologia da palavra "Patrimônio" vem do latim patrimoniu ou seja patri que significa pai somado a monium que significa recebido, o que foi recebido do pai, assim um conceito ligado a herança, e obviamente dentro da cultura do patriarcado, vem de uma origem em que os bens estão associados aos poderes de propriedade do pai. Matéria é também do latim e significa aquilo que é feito de pau, rebento de uma árvore, tronco de árvore, madeira, algo que tem existência palpável e, portanto, que tem massa e ocupa espaço, derivado de mater que, contraditoriamente a patrimonium, significa mãe.
“Patrimônio Imaterial é uma concepção que abrange as expressões culturais e as tradições que um grupo de indivíduos preserva em respeito da sua ancestralidade, para as gerações futuras. São exemplos de patrimônio imaterial os saberes, modos de fazer, expressão, celebrações, festas e danças populares, lendas, músicas, costumes e outras tradições.”
“Patrimônio Imaterial é uma concepção que abrange as expressões culturais e as tradições que um grupo de indivíduos preserva em respeito da sua ancestralidade, para as gerações futuras. São exemplos de patrimônio imaterial os saberes, modos de fazer, expressão, celebrações, festas e danças populares, lendas, músicas, costumes e outras tradições.” A palma, planta forrageira da família cactácea e originária do império asteca é algo palpável, tem massa e que ocupa espaço. Porém como toda matéria que se localiza como energia em permanente transformação, ela surge no Nordeste do Brasil vinda do México no século XVIII e aqui passa a se constituir como uma planta que possui um valor histórico-cultural para a sobrevivência do povo nordestino em regiões do semi-árido, quentes, secas, arenosas e até inférteis. Rica em água, energia, carboidratos, fibra, vitaminas A,B, C, proteína bruta (17 aminoácidos), sais minerais como ferro, potássio, cálcio, a palma se torna um alimento que nutre a terra, combate a fome e a desnutrição, garantindo o crescimento das crianças do nordeste, bem como de animais importantes para a vida e a economia da região. A palma pode se manifestar ainda na beleza de paisagens e cercas, no sabor da alta culinária de pratos guizados e doces, na qualidade dos óleos, nos sucos para dietas especiais, em xampus, loções e sabonetes, além de corantes, bioadesivos e xaropes.
A identidade, o sabor e o saber fazer relacionados com a palma manifestam a memória, a história e a arte em atividades tidas como corriqueira do dia a dia, mas que é de fácil percepção e entendimento como parte de um passado que se transmite de geração em geração. Neste sentido, o sistema agrícola e a culinária de um povo e de uma região se configuram como patrimônio material que se converte em patrimônio imaterial. Na verdade, a palma transcende o conceito de patrimônio material ou imaterial, diante das manifestações das tradições de um povo. Aquilo que recebemos das gerações que nos antecedem se limita a questionar respeito e energia ancestral para nossa identidade? A palma e diversos bens nos fazem refletir que o universo da tradição oral nos questiona: a que serve a ciência e o conhecimento, se não para garantir a celebração, sustentabilidade e direito a vida? A palma responde com seus valores nutricionais, culturais, econômicos e sociais e ainda com suas propriedades fitoterápicas para anemia, eliminação de toxinas do álcool e fumo, controle de açúcar e gordura influindo no colesterol e na diabete, diminuição de dores crônicas, controle de inflamações e osteoporose e propriedades anti-diarréicas e antiasmáticas. Cantemos e dancemos a palma, porque ao compreender o universo da tradição oral, compreendemos algo essencial da vida - tanto não podemos viver sem a sabedoria ancestral e a beleza do trabalho de nossos melhores alimentos como não podemos viver sem a beleza e o trabalho da dança, da música, dos mitos, das histórias de vida a eles vinculados. A palma é assunto pedagógico, político, social, econômico e vital.
Líllian Pacheco