Mestre Aurino e o Forró Quilombola
O Forró do Remanso existe desde o tempo de Justino Pereira, Seu Binô, pai de Mestre Aurino Pereira. A comunidade do Remanso surgiu nas margens do rio Santo Antônio na comarca de Andaraí no Pantanal do Marimbus. Mas o povo fez a travessia do rio para morar do outro lado do pantanal na comarca de Lençóis, inspirado pelo sonho de Seu Manoelzinho Pereira da Silva, primo de Seu Binô, de conquistar uma terra própria e parar de trabalhar na Fazenda Lagoa do Limão.
Aurino conta que nasceu em 1945 na fazenda, mas cresceu na comunidade do Remanso aprendendo a lidar com a terra e com a pesca tradicional para seu alimento e de sua família. Não foi fácil a conquista da terra, mas a comunidade resistiu, permaneceu e criou seu próprio modo de vida.
O pai de Aurino animava as festas da comunidade deixando o filho apaixonado pela sanfona de oito baixos. Quando Seu Binô ia trabalhar na roça, Aurino contava com a ajuda de sua mãe para pegar a sanfona no baú que ficava em cima do guarda-roupa e tocar escondido.
Próximo do horário de Seu Binô voltar, o menino Aurino guardava o instrumento trancado no baú da mesma forma como estava antes. Só que às vezes o pai percebia algo estranho e perguntava a sua esposa "Madalena, alguém mexeu na minha sanfona!?`` E ela respondia que não.
O tempo passou e o menino aprendeu sozinho a tocar a sanfona. Um dia seu pai Binô foi convidado para um casamento e levou Aurino com ele. Seu Binô tocava uma música atrás da outra, até que precisou ir ao banheiro. O filho pegou a sanfona e começou a tocar. Um tocador pegou a zabumba, o outro pegou o triângulo e o povo entrou no salão para dançar. Seu Binô voltou do banheiro e ficou admirado com o seu filho comandando a festa. Quando a música terminou, Seu Binô perguntou:
- Como você aprendeu a tocar sanfona, menino?
Aurino respondeu emocionado:
- Olhando o Senhor, meu pai!
Seu Binô então pediu pra Aurino tocar mais e o povo gostou. Veja o vídeo do Prêmio Griô na Escola na Internet e na TV, projeto nacional idealizado e coordenado por Líllian Pacheco no Grãos de Luz e Griô em parceria com o Ministério da Cultura, em que essa história é contada com a produção audiovisual de Delvan Quilombola.
Veja Vídeo Prêmio Griô na Escola e na TV em
https://www.youtube.com/watch?v=gvPAVHsEKmI
Aurino se tornou reconhecido como sanfoneiro da comunidade e casou com Dona Agmar Soledade, descendente indígena do sul da Chapada, agricultora familiar que cuida da feitura da farinha. Eles tiveram um filho chamado Natalino Pereira, apicultor e pescador, e um sobrinho, filho de sua irmã Judite de Jesus , chamado Domingos Caburé, agricultor e pescador, que é casado com Maria e teve um filho capoeira, griô aprendiz das tradições do quilombo, Delvan Quilombola. Natalino herdou o zabumba, Caburé o pandeiro e a viola, Delvan no pandeiro e a voz de cantador, formando o forró pé de serra com Seu Loi, Luiz Pereira, jardineiro e primo de Aurino, que é cantor e também compositor.
Com o passar do tempo e das roças, como diz o povo, as tradições foram desvalorizadas e a escola com sua educação descontextualizada, considerava os mais velhos como analfabetos. Os jovens não mais se interessavam em sua musicalidade, danças, saberes e fazeres.
Em 1998, chegou o Velho Griô caminhando, cantando com sua viola, na comunidade do Remanso e conheceu Aurino, foi nesse tempo que Líllian Pacheco e Márcio Caires, como educadores do Grãos de Luz e Griô começaram a criar as trilhas griôs e a Pedagogia Griô nas comunidades e escolas da Chapada Diamantina. Nesse tempo Delvan Quilombola era criança que participava do Grãos. O Velho Griô e os velhos amigos Aurino, Lina, Pedrina, Rosalina, Robertinho do Remanso e muitos outros velhos griôs das comunidades se juntaram a partilhar cantos, danças, histórias e saberes da Chapada e do Brasil. A parceria e amizade entre eles é histórica na luta pelas políticas de educação e cultura dos povos tradicionais.
Foi nessa caminhada que Aurino Pereira se tornou o Mestre Aurino, reconhecido pelo Ministério da Cultura na Ação Griô Nacional, contador de histórias no programa Trilha Griô, mestre das aulas da pedagogia griô em escolas e comunidades, professor de oficina de sanfona no ponto de cultura Grãos de Luz e Griô que representou o Brasil em aulas espetáculos em quinze palcos em três festivais internacionais em São Paulo e na Espanha.
Veja Aula Espetáculo Respeita os Oito Baixos DO TEU PAI. Banda Griô canta a História da Sanfona https://www.youtube.com/watch?v=mLk7wUoOtyE
Desde 15 anos de idade que Mestre Aurino passou a se dedicar a lideranças de ações na comunidade, e depois do decreto nacional 4887/2003 se tornou uma liderança importante junto com Robertinho do

Remanso no processo de reconhecimento da Associação e Território Quilombola do Remanso. O forró de Aurino foi editado em CD, numa produção do Grãos de Luz e Griô com Darlan Pereira e passou a se chamar Forró Quilombola, reconhecido na Chapada Diamantina e no Brasil.
Veja o Cd de Mestre Aurino e o Forró Quilombola em http://trilhagriochapada.org.br/forro-quilombola-do-remanso/
Aurino também se tornou referência para as novas gerações de crianças e jovens, na educação, na cultura e na política, junto com nomes inesquecíveis e lendários como Robertinho do Remanso e o fundador Manoelzinho do Remanso, pai de Getúlio que também toca zabumba. Todos eles foram referência para Delvan Quilombola que cresceu no Grãos e na capoeira e se tornou presidente da Associação Quilombola criando diversas ações de desenvolvimento comunitário e consciência negra na comunidade, relembrando e reinventando tradições, a exemplo da marujada, do Samba do Rio, da Quadrilha e da Festa do padroeiro da comunidade, manifestações culturais onde Aurino se tornou também Mestre.
Texto coletivo de Mestre Aurino Pereira, Líllian Pacheco, Delvan Quilombola ( Delvan Dias) e Márcio Caires, parte do projeto apresentado para reconhecimento de Aurino Pereira como Mestre da Ação Griô Nacional pelo Ministério da Cultura e Mestre da Ação Griô Bahia pela Secretaria de Cultura da Bahia.