Prêmios, encantos, projetos e outras palavras sobre filmagens recentes na Chapada

Em tempos de pandemia, distanciamento social e suas consequências para o trabalho, um fato me chamou a atenção: um videoclipe totalmente filmado nas grutas da Lapa Doce, Pratinha e Torrinha ganhou o prêmio de melhor direção de fotografia no Internacional Music Video Underground 2020 em Paris (festival francês especializado em videoclipes). O prêmio internacional foi para o videoclipe da cantora Luisa Sonza, que esteve na cidade de Iraquara em julho de 2019 para as filmagens da música “Fazendo Assim” (Produtora Team O, 2019). O trabalho alcançou mais de 15 milhões de visualizações no Youtube e contou ainda com a participação de profissionais residentes em Lençóis na equipe de produção. Conversei com Heitor (@heitor7), o diretor de fotografia premiado, sobre as filmagens: “Queríamos filmar em cenários paradisíacos, com cavernas. A princípio pensamos no México, mas logo lembramos dos tantos paraísos que existem no nosso país, entre eles a Chapada Diamantina. Visitamos algumas locações com antecedência, inclusive uma gruta que não está entre as mais famosas e que nos garantiu uma das melhores imagens do clipe”. Heitor se refere à gruta da Torrinha. O fotógrafo contou ainda que o desafio foi iluminar ambientes com baixa luminosidade ou até totalmente escuros. Foi necessário estudar com antecedência as condições de deslocamento, os equipamentos adequados e o tempo de montagem dos mesmos. Todo o planejamento ocorreu em diálogo com profissionais locais, em respeito à preservação dos lugares.
Outra produção que esteve na Chapada Diamantina foi a conhecida marca de roupas FARM (@adorofarm). A grife sediada no Rio de janeiro esteve no Vale do Capão no início de março, antes da quarentena, para produzir um dos seus famosos vídeos, que tem como tema os festejos do interior do Nordeste. Carlos Mach (@carlosmach), diretor do vídeo, diz que a conexão da FARM com o litoral está sempre em evidência, mas as cachoeiras também fazem parte do estilo de vida das pessoas envolvidas com a marca carioca. A equipe chegou dias antes das gravações para selecionar dançarinos da região em um intenso ritmo de trabalho que durou 10 dias. Carlos conta como foi trabalhar com artistas locais: “Foi uma surpresa muito boa ver tantos artistas aí. A Bahia é mesmo um lugar de pessoas incríveis! Com cada um aprendemos algo e acredito que o resultado do vídeo é fruto dessa comunhão. A gente cria relações fortes com a equipe e essa foi muito especial! ” A data de lançamento do trabalho precisou ser adiada devido à pandemia. Junho é um mês provável.
Mas vamos sair do âmbito Rio-São Paulo?! A Bahia é um centro de criatividade e movimentação de recursos financeiros e humanos. O setor é amplo, diverso e abrange obras de ficção, webséries, videoclipes, vídeo-arte, além de documentários, cineclubes e outras ações de difusão e formação de público, como oficinas, festivais e mostras que fazem circular as produções. Neste contexto, a Chapada Diamantina se destaca não apenas como cenário, mas, principalmente como um ambiente que está sempre desenvolvendo ideias e projetos. Alguns exemplos: a TiVi Griô – Web TV e TV comunitária de Lençóis (Grãos de Luz e Griô). Um trabalho que valoriza o protagonismo dos jovens lençoenses em todas as etapas de produção e que aborda assuntos ligados à cidadania e Direitos Humanos. Michele (@michapreta_) tem 20 anos, é uma das gestoras da TiVi e diz que este é um “trabalho de fortalecimento da luta ao registrar a cultura local. Um trabalho que me orgulha e me surpreende, pois nunca pensei em produzir, filmar, fotografar e editar vídeos. Meu caminho no audiovisual está só começando, mas ando devagar e piso com cuidado para aprender, fortalecer e publicar a história da minha comunidade. ”
Já o Circuito Transições (Coletivas/ Zanzar Filmes), realizou um trabalho de produção, premiação e circulação de curtas documentais, trazendo histórias de transformação de vidas no contexto da Chapada. A jovem jornalista Carol (@carolineoolv) foi uma das pessoas que topou contar sua história diante das câmeras e narra o momento em que o filme foi apresentado no seu lugar de origem, a comunidade quilombola da Cutia, em Boninal: “a exibição foi importante para a autoestima da comunidade. Para além das histórias que estão sendo contadas, se ver e ver alguém conhecido seu é muito importante. É perceber que a sua história tem valor. ” Vale citar ainda o trabalho de formação de público e divulgação do cinema baiano realizado desde 2017 pelo Cineclube Fruto do Mato (Cinepoétyka Filmes), em Lençóis. Em suas exibições ao ar livre, o cineclube reúne uma média de 150 pessoas, distribui pipoca e realiza rodas de conversa ao final de cada exibição. Desde 2019, a curadoria vem dando ênfase ao trabalho realizado pelas cineastas negras nacionais na atualidade. A continuidade do projeto é um ponto forte, suas ações para este 2020 atípico estão em planejamento, assim como o sonho de fortalecer o movimento cineclubista através da união em rede de outras iniciativas semelhantes.
Estes três projetos tem a cidade de Lençóis como base. A conhecida porta de entrada para o turismo na região segue firme como importante núcleo audiovisual. A cidade é berço de produções históricas e de Orlando Senna, cineasta, escritor, jornalista e uma personalidade importante para o cinema e as artes no Brasil e no mundo. Além de lançar o filme “Longe do Paraíso” em 2019, o cineasta compartilha o seu conhecimento em oficinas realizadas na cidade, sendo que 2 roteiros saídos destas oficinas ganharam vida: “Chica Garimpeira” (Andrea Guanaes, 2018) e “Jardim de Plástico” (Delmar Araújo, 2008).
De grandes produções a projetos de inclusão social, a Chapada Diamantina é um lugar de múltiplas potências, seja pela sua natureza exuberante ou pela diversidade humana. Para os profissionais locais, é importante seguir com a formação continuada, profissionalização, organização e divulgação do próprio trabalho. Para quem planeja futuras produções em um momento pós-pandemia, vale pesquisar quem está disponível para atender diversas demandas: por aqui temos dançarinos, atores, músicos, produtores, guias e empresários do trade turístico que fazem acordos para hospedagem, alimentação e deslocamentos. Ainda não sabemos quando nem como voltaremos a receber visitantes, mas conhecer virtualmente o trabalho dos nossos profissionais já é uma boa opção! E no garimpei.com é possível pesquisar o contato e links com o portfólio de alguns deles!
Texto e foto: Renata Reis (@a.renatareis)